quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Singela Citação

(título em homenagem ao meu amigo Guilherme)

"Lúcio é homem inteligente, sabe que consciência de valor é também consciência de limitação, que a realização e a frustração habitam o mesmo teto. Já em 52 quando o próprio êxito da arquitetura moderna parecia mostrar iminente a realização do sonho de um período de unidade, a frustração irrompia. Lúcio vê que o 'modernoso' emerge e fala que o grave desajuste tem como causa 'a circusntância de o movimento de renovação arquitetônica (no país) haver-se desenvolvido à revelia do ensino oficial, que passou a adotar o regime da liberdade desamparada do indispensável esclarecimento, como se a arquitetura contemporânea dita moderna fosse mera questão de licença ou de improvisação do capricho pessoal... e o ensino acadêmico apropriado... dispensável à boa formação profissional'. Há um quê de melancolia, irritação e justiça nessa observação e, infelizmente, relevância atual. O analfabetismo aumentou e a retórica sentimental tem quase sempre abafado a reflexão."

Citação extraída do texto "Lúcio Costa - da atualidade de seu pensamento" de autoria de Carlos Eduardo Dias Comas


Achei importante essa passagem, pois como o Comas fala no final, essa preocupação ainda se mantém atual. Além obviamente da clareza em que é colocada a questão.

abraço a todos.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Athos Bulcão

Se niemeyer foi o arquiteto e Lúcio Costa o urbanista de Brasília, Athos Bulcão foi seu artista/"decorador"/designer de superfície. Destaco duas citações extraídas de dois artigos sobre ele e algumas imagens de suas paredes.


A função dos azulejos é a de “amortecer a densidade das paredes a fim de tirar-lhes qualquer impressão de suporte”. Lúcio Costa (FREiTAS.1997)
“Quando não são empregados azulejos brancos, deixo igualmente a critério dos operários a livre disposição de um só elemento, uma só ‘letra do alfabeto’, para realizar uma escritura. Quando, em vez de uma ‘letra’ existem duas, a disposição do desenho será, também, livremente manejada”. Athos Bulcão(MORAIS, 1988)


Athos Bulcão


Instituto de Artes, UnB, Brasília.


Salão Verde.Congresso Nacional, Brasília.


Salão Verde.Congresso Nacional, Brasília.


MORAIS, Frederico. Azulejaria Contemporânea no Brasil. Editoração Publicações e Comunicação. São Paulo, 1988

FREITAS, Grace.Módulos em Expansão. Correio Braziliense. Brasília, 1997.

sábado, 11 de outubro de 2008

Artigo Museu Iberê Camargo

Posto aqui um singelo artigo de minha autoria, publicado no jornal A Razão, de Santa Maria, no dia 20 de setembro de 2008.

Nova sede da Fundação Iberê Camargo: uma visita necessária

Há poucos meses foi inaugurada a nova sede da Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre. Projetada por famoso arquiteto, o português Álvaro Siza Vieira, esta edificação, apesar de precoce, já figura entre os mais importantes prédios da atualidade, tendo seu projeto recebido o Leão de Ouro na Bienal de Arquitetura de Veneza, em 2002. A construção é, por si, verdadeira obra de arte. A brancura límpida de seu volume em concreto, bem como a pitoresca linha de suas curvas fazem o contraste necessário com o verde que a circunda, constituindo mais um objeto de destaque da cidade. As poucas e suficientes aberturas valorizam a paisagem, emoldurando uma Porto Alegre ainda ávida por arte e cultura.

O prédio protege a obra de Iberê Camargo, renomado pintor do século XX, o qual teve laços fortes com a cidade de Santa Maria. Nasceu em Restinga Seca em 1914 e passa a morar em Santa Maria no Bairro Itararé, na casa de sua avó Chiquinha, aos 13 anos de idade. Sua iniciação artística começa aqui, na antiga Escola de Artes e Ofícios, inicialmente com o professor Frederico Lobe e, mais tarde, Salvador Parlagrecco. Seu amigo de infância, Edmundo Cardoso, foi o detentor de poucas e raras obras desta primeira fase, sobreviventes do incêndio da escola. Faleceu em Porto Alegre, aos 79 anos, depois de longa e profícua carreira. De personalidade forte, sempre foi um agitador cultural, tendo exercido importante influência na intelectualidade de seu tempo. Materializou obras que ilustram as fragilidades e angústias da vida, através de seus famosos carretéis, ciclistas e idiotas. “Debruço-me sobre este misterioso poço, insondável, que existe em cada homem”, dizia o artista.

A visita ao museu é interessantíssima. No estacionamento sob a avenida Padre Cacique já se percebe que se trata de obra incomum, contando com paredes revestidas de azulejo holandês e forro de gesso. Saindo do mesmo, a grandiloqüência do volume branco fala por si, em uma caminhada sugestiva até a entrada. A apoteose se dá neste momento, em que o grande átrio mostra sua imponência. O percurso sugerido é de que se suba até o último pavimento por elevador e se desça pelas rampas, vislumbrando a inquieta obra de Iberê de um lado e a bela paisagem de Porto Alegre do outro. Uma aconchegante cafeteria completa o quadro, tendo como motivo principal a orla do Guaíba. A Fundação, além do museu, conta com toda a parte administrativa, ateliês, auditório e centro de documentação.

Sua visitação torna-se necessária e fundamental, tanto por abrigar as pinturas deste renomado artista quanto simplesmente por sua bela arquitetura. Iberê deve a Santa Maria o incentivo de seus primeiros traços e nós devemos a ele esta silenciosa e justa homenagem.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

depois daquele tatu

Desculpem-me postar esse texto que nada tem a ver com arquitetura. Mas é que é um dos textos mais espetaculares que já li na vida e gostaria de compartilhar com todos. Desculpem tb não falar aqui de Borges, Saramago ou Brecht. Pq a vida pra mim não foi a mesma depois daquele tatu.

Depois daquele “tatu”

Por Canfild que é o Vinícius

A semana passada em uma sinaleira, olhei para o lado e avistei uma bela mulher. Com culpa por minha atitude de macho, calhorda, “babaca” e babão disfarcei e fitei o infinito. O semáforo continuava vermelho, espiei novamente. Atônito, vislumbrei uma cena inesquecível. Um lindo rosto, com olhos escuros amendoados emoldurados por cabelos quase dourados, servia de tela para uma cena escatológica: a moça mexia freneticamente seu dedo em direção ao interior de sua narina direita.
O sinal abriu, ela continuou na busca desenfreada de algo dentro de si. Eu, também, não arranquei. As buzinas recriminavam nossa imobilidade. De repente ela conseguiu, retirou algo que grudou em seu dedo indicador e com o polegar amassou-o e como uma criminosa virou a cabeça para os lados para certificar-se da impunidade. Ao cruzarmos nossos olhares, sorriu com um ar de gozo e cumplicidade e jogou pela janela do carro aquela pequena bolinha. Imediatamente acelerou e sumiu.
Refletindo sobre o ocorrido, imaginei-a fazendo “cocô”. Senti o cheiro de seus refugos fisiológicos. Saboreei seu beijo matinal ao acordar com gosto de saliva putrefada. Sonhei com seu corpo e com orgasmo mútuo que nos proporcionamos. Pensei sobre as conversas “cabeça” e sobre a possível inseparabilidade de nossas almas e a ideal felicidade que viveríamos. Nosso mundo poderia ser compreendido, aqueles momentos haviam mudado nossas existências. Agora tudo seria possível.
Hás vezes enxergo assim a Psicologia, com suas qualidades e pecados, com suas múltiplas facetas e, também, com uma indivisibilidade, com características ilimitadas e infinitas. Talvez, as contradições e as não verdades sejam os motores de uma não ciência, que tenta ajudar-nos a sermos “cientes”.
A propósito, nunca mais a vi depois daquele “tatu”!